Movimentar o pensamento
Por Luís Mauro Sá Martino
Uma imagem comum costuma associar filosofia a livros complicados, palavras difíceis e termos complexos, que às vezes demandam anos de estudo para sua compreensão. Essa noção não está errada, mas existem outras possibilidades. Quando o que chamamos de “filosofia” começou a se delinear na Grécia antiga, há cerca de 2500 anos, a ideia era um pouco diferente: filosofia não é algo que se sabe, é algo que se vive.
Em suas origens, a filosofia estava ligada a uma abordagem prática da realidade: o conhecimento não era visto como algo descolado do cotidiano, ao contrário. Sua principal finalidade era justamente ensinar a viver. A filosofia era entendida, ao menos em parte, como a reflexão voltada a encontrar a sabedoria para uma boa vida – começando, aliás, pela pergunta sobre o que é uma vida boa.
Não por acaso, nos diálogos de Platão, Sócrates conversa com as pessoas de seu tempo em busca de conhecimentos que o ajudassem a viver melhor sua vida – o conhecimento como algo vivo, não dado: a argumentação de Sócrates se movia na abertura das perguntas feitas.
Isso não significava, nem naquela época, nem agora, que a filosofia possa se reduzir a ideias prescritas ou aplicadas a qualquer situação. Poucas coisas estariam mais distantes da filosofia do que um tipo de atividade mecânica e indiferente: ao contrário, ela se caracteriza pelo movimento do pensamento, pelas inquietações que se transformam em perguntas e, com sorte, respostas (ao que parece, fazer perguntas é mais importante do que encontrar respostas).
Por que as coisas são como são? Quem disse que é, ou deveria ser, assim? Como pode melhorar? Isso pode remeter à perguntas feitas na infância, e não é coincidência: como lembra Aristóteles na primeira frase de sua “Metafísica”, diz que todos os seres humanos naturalmente desejam saber. Prova disso, argumenta, é a alegria de olhar para descobrir coisas novas. Às vezes, na vida adulta, perdemos um pouco da espontaneidade da pergunta na acomodação do cotidiano.
Um dos principais caminhos para movimentar o pensamento é perguntar, procurando criar um estranhamento em relação ao mundo no qual se vive. Esse exercício pode ser realizado todos os dias, e não estaria muito distante do que Sócrates propunha como método. Daí o percurso filosófico cotidiano como uma estratégia para boa vida: no lugar da repetição mecânica, um pensamento que questiona e se posiciona contra a realidade – para, a partir desse embate, talvez entender alguma coisa.