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Psicanálise - 16 de fev

Mal estar, Sofrimento e Sintoma

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Por Casa do Saber

ícone tempo de leitura Leitura: 5 mins

Neste texto, iremos abordar sobre três noções que foram desenvolvidas no livro: “Mal-estar, Sofrimento e Sintoma - uma psicopatologia do Brasil entre muros”(Christian Dunker, Boitempo, 2015). Ou seja, como o próprio título do livro diz, falaremos sobre mal-estar, sofrimento e sintoma.

A ideia desenvolvida a partir dessas noções é a de expandir o atual entendimento sobre o que é o transtorno mental. Atualmente, eles estão reduzidos a um catálogo com mais de 400 subtipos de pequenos funcionamentos, como a depressão, pânico, transtorno obsessivo compulsivo, dismórfico corporal, entre tantos outros. Nessa direção, poderíamos expandir quase que indefinidamente as maneiras como nomeamos, tipificamos e, consequentemente, tratamos e interpretamos as diversas formas de transtornos. Por isso, as reflexões trazidas a partir das três noções elencadas aqui buscam redefinir o cenário e encontrar um caminho intermediário entre sintoma e mal-estar.

Confira esse conteúdo em nosso canal do YouTube, com explicação de Christian Dunker:

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O sintoma e a busca pelo lugar natural

O sintoma, para a psicanálise, é uma espécie de fragmento de verdade. É algo que não conseguimos escutar, pôr em circulação ou participar nas nossas trocas sociais. É a expressão de uma contradição, de uma satisfação que não admitimos em nós mesmos e que ficou paralisada no transcurso da nossa vida. Para Lacan, o sintoma tem uma estrutura de metáfora. Fazendo uma comparação, se a vida é como um rio, em que você vai seguindo um fluxo, o sintoma é como uma ilha. É um ponto que não se consegue avançar ou uma inibição e erro que se repete diversas vezes.

Por outro lado, os sintomas se enquadram em uma categoria que possui uma aspiração filosófica, em que nos inspira a falar sobre condições de nossa existência. Trazendo uma referência à física de Aristóteles, eles nos conduzem à uma busca pelo que seria o nosso lugar natural. O trágico do humano é que nós não temos lugar natural. Nem mesmo a nossa casa, a barriga da mãe ou a família. Somos seres que perderam o lugar natural porque nos tornamos livres e, em outro sentido, porque falamos. Ao falarmos, vamos nos descentrando e, nesse percurso, somos levados além do que gostaríamos de dizer. Somos conduzidos a um conjunto de experiências que são determinadas simbolicamente e no real, mas que, ao mesmo tempo, são indeterminadas. Essa é a aventura trágica do humano. Nós não fomos feitos para algum destino que está “escrito nas estrelas”. Como Heidegger interpretou, nós estamos jogados nesse ser que possui uma indeterminação. Sob uma ótica otimista, isso pode parecer animador. Essa liberdade permite que cada um crie o próprio destino, a própria história. Por outro lado, essa constatação é fonte permanente de mal-estar.

O sofrimento como narrativa

Entre as duas condições já mencionadas aqui, sendo o sintoma relativo à uma história particular, e o mal-estar posicionado como uma condição existencial de viés mais universal, faltava uma noção intermediária entre as duas. Assim, chegamos ao sofrimento como terceira noção, que assim como o mal-estar, resiste ao nome que atribuímos. O sofrimento tem uma estrutura de narrativa, onde depende de atos de reconhecimento e muda conforme se fala sobre ele. Então, temos de um lado o sintoma (metáfora), do outro lado, o mal-estar (nomeação) e, entre eles, o sofrimento (narrativa/ história). A história demanda reconhecer e inscrever essa combinação entre mal-estar e sintoma numa outra forma de linguagem. Por isso, o sofrimento tem um efeito coletivo muito forte. Quando a pessoa conta sobre o seu sofrimento ao outro - ao menos em tese - este outro sofre junto. E todos aqueles aos quais a pessoa está ligada sofrem juntos e, em alguns casos, cria-se até mesmo uma situação delicada em que não se sabe quem tem o sofrimento “mais justo”. Existe uma busca pela ideia de que ter uma posição de sofrimento legítimo é por si mesma transformativa. Mas, o ponto levantado, é que o sofrimento tem valência política. As pessoas podem escolher as formas de sofrimento que querem iluminar, ao tempo que também escolhem as que não precisam - ou não querem - colocar em destaque.

Um sofrimento não precisa sempre de um nome

A situação que encontramos atualmente devido à forma de abordagem que se dá ao sofrimento mental é a de que, para o sofrimento ser legítimo, ele deve ter um nome digno. Transtornos catalogados como transtorno disfórico pré-menstrual, depressão, bipolaridade, entre outros, tem nome, indicação de diagnóstico e tratamento. Sem um nome, as outras pessoas podem não acolher, não se interessar ou mesmo o nem mesmo o Estado irá tratar. Essa postura frente aos transtornos mentais não é adequada. Não é preciso que todas as formas de sofrimento se reduzam ao código psiquiátrico ou mesmo ao diagnóstico psicanalítico.

O sofrimento é uma categoria intermediária que envolve atos de reconhecimento,jurídicos, intersubjetivos, relacionais ou institucionais, mas também que envolve a noção de narrativa. Narrativa é quando conseguimos nos colocar na história. Se fazemos uma viagem e a contamos como uma descrição, ela fica mais pobre. Ao passo que quando partilhamos o nosso processo de transformação introduzido pela viagem, ela se torna mais interessante. Por isso, o sofrimento também tem uma estrutura de viagem.

A partir das reflexões trazidas aqui, espero que se consiga compreender que não precisamos reduzir todas as formas de loucura ao patológico no sentido doentio. A nossa loucura é o limite da nossa liberdade, mas é também o limite da nossa possibilidade de relação com o outro.

Por Christian Dunker

Este conteúdo foi transcrito do canal da Casa do Saber no Youtube. Para conhecer mais acesse https://www.youtube.com/@casadosaber

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