Sobre amor e falta
Por Ana Suy
Quando comecei a estudar o tema do amor na linha de pesquisa de psicanálise no mundo acadêmico, muita gente me perguntava “mas por que a psicanálise para estudar o amor?”
Vale dizer que o amor, embora seja um tema de absoluta importância na psicanálise, não é um conceito psicanalítico. Então, essa é realmente uma questão válida, já que podemos estudar o amor a partir da literatura, da filosofia, da biologia...por diferentes vieses.
Se abordo o tema do amor pela via da psicanálise, certamente é por sua relação
com o desejo (este, sim, um conceito). Por isso minha primeira pesquisa (que resultou em
minha dissertação de mestrado – que se transformou depois no livro “Amor, desejo e
psicanálise” – publicado pela Editora Juruá) abordou a relação do amor com a falta.
Amar é sentir falta. Quando amamos, sentimos falta da pessoa, muitas vezes,
mesmo estando com ela! Já aconteceu isso com vocês? De estar junto com alguém e
querer estar ainda mais junto? Porque é próprio do amor querer eliminar a falta, querer
fazer de dois um só. Então, perto nunca é perto o suficiente. No amor queremos entrar no
corpo do outro, em seus pensamentos – o que não deixa de querer ser aniquilar ao outro
e/ou a nós mesmos. Pois é, o amor é mortífero!
É por isso que o amor precisa de falta, para não matar a si mesmo. É por isso que os amantes precisam da falta – para não exterminar o amor que os une. O amor, então, ao mesmo tempo que aproxima, afasta. É o desejo, enquanto a marca de uma falta, que é protetivo do amor e neutraliza o que há de mortífero nos amantes.
Paradoxalmente, amar, então, é suportar o impossível de realizar o amor de forma plena.
Contamos, ainda, com certa “ajuda” do amado, que volta e meia nos decepciona, em algum nível e permite que ninguém ame ou seja amado o tempo inteiro. Ainda que em nossa fantasia neurótica reine a ideia de que haveria uma forma absoluta, estática e garantida de amar, a realidade nos demonstra o impossível de amarmos alguém de modo absoluto. Nem mesmo a nós mesmos conseguimos amar o tempo todo...quem dirá amar o outro?!
Termino esse texto, então, concluindo que amar tem mais a ver com tolerar os furos do amor e dos amados, do que com fazer um com o outro. Mas vale dizer que um depende do outro: o desejo de fazer um precisa existir para que possamos tentar, e é preciso que isso fracasse para que sigamos tentando.
Falo mais sobre o tema do amor no curso que gravei para a Casa do Saber, que se chama “Amor e Solidão”. Aliás, falo mais sobre o amor em tudo o que escrevo e falo e por isso, certamente voltarei a escrever mais sobre o amor nessa coluna.
Até a próxima!